Capítulo 8

O REVÉS


Deve ser terrível viver, como os índios, sem tecnologia! Podemos ter eletricidade, tomar banho quente, ver televisão, falar no telefone, no celular, na Internet, congelar os alimentos para depois aquecê-los em microondas, lavar roupas em máquinas, refrigerar ou aquecer o ar. Temos carros, motos, aviões...


E vejam só que interessante! Tudo isso para tornar minha vida mais prática, sobrar mais tempo para trabalhar mais, ganhar mais dinheiro para poder comprar mais tecnologias, roupas de grifes, um novo modelo de carro, celular... Quando chegar o fim se semana posso ir a cinemas, restaurantes, boates e shows com minhas roupas de grife, e a malhação que fiz na academia de ginástica, quando sobrou um tempinho. Assim, serei a mais bela de todas e poderei escolher o rapaz mais belo de todos, aquele que fez exatamente a mesma coisa que eu, por isso foi escolhido (pelo menos temos assuntos em comum).


Mas para manter um relacionamento com ele, vou ter que trabalhar mais, ganhar mais dinheiro para comprar roupas de grifes novas (não dá pra repetir roupas, não é!), trocar de carro, celular... Também preciso manter meus cabelos lisos e coloridos, a pele esticada, silicone nos seios, na região glútea, lipoaspiração e mais malhação...


Ainda prefiro ter toda a tecnologia de ponta! Só não sei o que vou fazer com tudo isso depois que desmatarem todas as florestas, esgotarem toda água potável, energia elétrica, energia nuclear e as calotas polares derreterem, porque a poluição foi tão grande que criou o efeito estufa e superaqueceu o planeta.


Nesse momento, talvez, eu me lembre do que estava escrito na carta do cacique Seattle, senão... Já sei, pego na Internet. Mas não dá para pegar na Internet, não tem mais energia! Ah, que pena! Aquela carta era tão bonita! Lembro-me que fiquei comovida e emocionada assim que li, até mandei por e-mail para os amigos... Mas, depois não tive mais tempo para pensar nisso, tive que trabalhar mais, porque aquele rapaz que eu estava namorando me deixou, por outra mais nova, mais bonita, mais magra e com mais silicone... Bem, tive que malhar mais, trabalhar mais, ganhar mais dinheiro para comprar tudo novo para elevar a auto-estima...


Perdoe-me, tenho essa mania de divagar... Espero não ter sido enfadonho!


Depois de escrever essas divagações, “coincidentemente”, uma reportagem do jornal “O Globo”, no caderno de Economia, do dia 20 de julho de 2008, chamou minha atenção e, como já disse antes, aproveito-as ao máximo.

Tomei a liberdade de transcrever uma parte da reportagem, para provar que minhas divagações não são frutos da minha imaginação.

"A preservação do meio ambiente está na moda. Mas o consumo ecológico ainda não conquistou cariocas com poder aquisitivo e nível de instrução alto. Estudos da Escola de Negócios da PUC-RJ mostra que, na hora de decidir o que comprar, esse consumidor continua privilegiando critérios como preço e marca. Já o fato de o produto ser poluente ou não fica em último plano. A pesquisa – que começou a ser feita há dez anos e entrevistou mais de 600 pessoas, a maioria alunos da universidade – realizou diversas simulações de compra, para identificar o que é considerado mais importante na hora de escolher um produto. Num levantamento de 2008 sobre o consumo de cadernos, por exemplo, 39,2% disseram que preço é o item que mais pesa. Outros 39,2% apontaram a marca, e 18,69% afirmaram escolher o caderno pela capa. Já o uso de papel reciclado na fabricação do produto foi identificado como primeiro critério de escolha por apenas 2,9% dos alunos.


O professor André Lacombe, responsável pela pesquisa na PUC-RJ, observa que a maioria dos entrevistados concorda que problemas ambientais são de responsabilidade conjunta de governo, empresas e consumidores. Mas, embora reconheçam o peso de sua participação na preservação do meio ambiente, não compram de maneira responsável.


[...] Segundo a pesquisadora da Embrapa Maria Cristina Neves, o mercado ecológico virou grife. Com isso, as margens de lucro aplicadas pelos supermercados sobre alimentos orgânicos costumam ser maior que a de outros produtos.”


Esse comportamento, como já disse anteriormente, é o reflexo de uma sociedade consumista, alimentada pela própria sociedade e bombardeada pela mídia, maior veículo de divulgação e mantenedor desse comportamento (não há interesse por parte da mídia em modificar esse comportamento, ao contrário, ela se alimenta dele. O lucro da programação é obtido através de patrocinadores e propagandas de produtos que, por conseguinte, defendem o interesse do consumo exacerbado visando o lucro), ditando regras de comportamento, padrões de beleza, lazer e trabalho. Não existe estímulo à reflexão no intuito de medir as conseqüências desse comportamento. O estímulo oferecido orienta para a realização pessoal e individual, vinculado ao acúmulo de bens materiais, em detrimento ao bem estar coletivo.


As imagens são construídas baseadas na superficialidade, no efêmero e descartável. A ideologia é voltada para obtenção de recursos (lucros) desmedidos através do consumo exagerado. Trata-se de um transe coletivo baseado em valores contrários àqueles necessários e fundamentais para a harmonia do indivíduo, do coletivo, conseqüentemente, do Universo.


A satisfação, sendo superficial, cria um estado de felicidade inatingível, levando o indivíduo a desenvolver inúmeras doenças como stress, hipertensão, depressão e outras. A indústria farmacêutica também se alimenta desse padrão de comportamento, pois deseja sua fatia de lucro desmedido, oferecendo drogas fortíssimas como fórmulas “milagrosas”, enquanto que, o verdadeiro milagre, consiste em uma mudança de consciência.


Bem... Já sabemos das devastadoras conseqüências que esse comportamento têm nos acarretado. Afeta nossa saúde, a degradação de valores dos indivíduos, a degradação ambiental (grande concentração de poluentes no ar destruindo a camada de ozônio e provocando mudanças climáticas; extinção da biodiversidade; poluição sonora e visual; crescimento desordenado nos centros urbanos e tantas outras ações inconseqüentes provocadas pelo homem), e não seria exagero dizer, a extinção da vida na Terra.


Também já sabemos que a mudança no padrão de comportamento, a alimentação mais sadia; o uso da medicina alternativa no lugar de drogas farmacêuticas; a meditação; a busca do autoconhecimento; a filosofia de vida baseada na ética, no equilíbrio, no bom senso e no senso comum, descortina um panorama mais amplo, mais universal, onde as partes constituem o Todo, interagindo, de forma que, as partes interferem no Todo. Que nós somos as partes, o Universo é o Todo. Razão pela qual insisto em dizer que o Universo é um Todo interligado, e cada ação do homem interferem no Todo. Também por essa razão somos Deuses, por podermos interferir no Todo. Só que não estamos agindo com consciência de Deuses. Estamos agindo como criancinhas mimadas que insistem em não amadurecer...


A criança mimada é assim: Acostumada a ter todas as vontades satisfeitas, quando advertida sobre os riscos de ter seu pedido atendido, mesmo depois de fortes argumentos, ela não consegue perceber as conseqüências num campo de visão amplo, pois seu universo é restrito e foi estimulada a pensar apenas em si mesma.


Agora que agente sabe tudo isso, nos tornamos mais responsáveis por nossas ações. Como uma criança crescendo, à medida que vai se conscientizando de todas as coisas, vai ficando mais responsável e também sendo cobrada a agir de forma responsável.


Já sabemos que podemos escolher. Já sabemos que existem várias visões a cerca do Universo. Já sabemos onde vamos chegar se continuarmos no padrão de comportamento atual. Sabemos como mudar esse padrão. A decisão é nossa, exclusivamente nossa. Agora não adianta dizer: “Ah... Mas eu não sabia!”


“O homem faz o mal, porque não sabe o que é o bem.”

Sócrates


“Existe apenas um bem, o saber, e apenas um mal, a ignorância..”

Sócrates